Ça n'est pas vrai!

5.7.07

Perfeição

Via-se beleza dos pés à cabeça.
Nunca havia um único fio de cabelo fora do lugar. Os olhos amendoados, cor de mel, cílios espessos, longos e escuros. Maçãs do rosto bem desenhadas, altas. Rosto magro, corpo enxuto, pele lisa e macia.
Narcisa era bonita e sabia disso.

Andava nas ruas com ar imponente e cada vitrine lhe servia de espelho.
Sempre foi sinônimo de beleza onde quer que estivesse.

Sabia-se bonita e isso representava a ela mesma como o aval necessário pra inovar: vestia-se bem, com sofisticação e lançava moda no trabalho e entre as amigas e conhecidos.

Na mesa do bar, do restaurante, de um café, ou num bate-papo descomprometido num coffee break do trabalho contava sobre os livros, conjeturava idéias suas sobre filósofos, sociólogos. Mencionava o livro de física quântica que acabara de ler. Ao mesmo tempo, criticava a roupa que um novo rosto da TV aparecera ao seu lado na Fashion Week.

Se recebia ares de desprezo, fazia-se de blasé e entendia aqueles olhares como desejo de verem no espelho o que ela via: bonita, inteligente, culta, sofisticada.

Saía quase todas as noites. Ia a shoppings e salões de cabeleireiro com amigos e colegas fazendo as vezes de personal styler. Dava dicas de cosméticos novos, de como usar roupas e penteados.
Falava também sobre música e cinema e não raras vezes convidava um ou outro para uma apresentação de teatro, um show, uma exposição.
Atualmente, dispensa especial atenção a uma garota recém contratada em seu escritório: Irene é inteligente, esperta e bonita. Conversam muito, estão sempre juntas e Narcisa a aconselha em questões das mais diversas.
Irene até tem ficado mais bonita ainda, mais atraente.
Corre à boca pequena que uma é a versão mais nova da outra, mas ninguém quer dizer isso à Narcisa: temem deixá-la nervosa com a possibilidade de Irene tornar-se o centro das atenções.

Sozinha, em casa, Narcisa ri sozinha... Sabe bem que é impossível que outro alguém a ofusque. Diz para si mesma: “Charme, estilo e personalidade não se compram, não se vendem, nem se transmitem em conselhos. Mesmo que estes venham da fonte mais pura.”