Ça n'est pas vrai!

26.5.06

Possibilidades

Acordou às 6:30 e sabia do frio tão logo uma lufada de vento gelado invadiu seu quarto vindo do corredor em direção ao banheiro.
Tomou um café sem capricho e saiu desembalada pela porta da cozinha nem sabendo que o farol fecharia ao passar do ônibus dando-lhe tempo necessário para nele entrar antes que descesse a rua sem lhe ver.
Quieta e tranqüila, sozinha no último banco, não tinha noção de que a boa notícia a aguardava em um envelope branco em cima da mesa com a resposta favorável à mudança de cargo solicitada e desejada já há meio ano, na esperança também do acréscimo dos rendimentos. Ao se deparar com o futuro no seu presente ao abrir o envelope, sorriu com os olhos e também com os cantos finos da boca miúda. Sentiu um estranho calor nos olhos e o frio de uma lágrima a escorrer-lhe pelo olho direito e embaçar a lente dos óculos de míope.

No terceiro trim, a mão atendeu ao telefone enxugando as mãos ainda no pano de prato, mãos amareladas do cascar cenouras. Reconheceu a voz do outro lado, mas não sabia da alegria que ia lhe tomar por inteira, feliz que ficaria ao saber que a filha, a quem só o bem desejava e a quem, há mais de um ano, dedicava cuidados especiais para que o desânimo não a ocupasse por completo, esta mesma filha, daria-lhe uma boa notícia, destas que ela, mãe, sabia fazer jus a toda dedicação e empenho sempre demonstrados pela menina.
E a moça trabalhou feliz aquela manhã toda sem ter consciência de que, durante o almoço, seus verdadeiros amigos, felizes que também estavam por ela, “exigiriam” uma comemoração naquela noite.
Voltou ao trabalho já cheia de novas incumbências sem saber se daria conta de tanto fazer, embora tudo o que tivesse fosse vontade.
Foi para casa tomar um rápido banho ao fim do dia antes de rever os amigos. Não tinha idéia de que seus pais a esperavam com abraços, beijos e uma deliciosa sobremesa.
Saiu depois, feliz ainda que estava.

Com os amigos, conversaram, riram, comeram, beberam e ela foi ao banheiro sem saber que, no curto caminho, encontraria um cara que nunca vira. Ele também a comemorar o bom resultado na prova de qualificação de seu doutorado. Um moço bonito para o seu gosto. Também não sabia que ele conversaria coisas que ela gosta de falar.
Voltou à mesa dos amigos com um número de telefone no guardanapo. Outro desses na mão do rapaz que ligaria no dia seguinte, à hora do almoço, quando ela não estivesse esperando. Combinariam um cinema e a história pode acontecer.É aqui que eu fico (e você também). Se o fim é feliz ou triste, não nos cabe saber e eles vão decidir. A essência está aí e, desejando, levarão a história para o melhor caminho. De preferência para um lugar qualquer perdido neste espaço onde não haja a palavra fim.